20/07/07

Silêncio

O silêncio, assim como tudo o mais que chego a julgar conhecer, está em constante mudança.
Vejo-o desviar-se da máscara a que me vou acostumando e, por breves instantes, perco a minha identidade. Não sei nem compreendo a mudança inesperada, e, por isso, perco-me. Posso contentar-me com o facto de me ter sempre reencontrado, de ter arranjado novas acções para o silêncio, apesar de estas estarem também cobertas de uma nova máscara.
Temo chegar ao fim de um caminho imprevisto sem conhecer verdadeiramente o silêncio, apesar de o estudar contínua e desesperadamente, até não conseguir soltar-me dele.
Há quem associe o silêncio à solidão, e a verdade é que essa era também uma das minhas tendências. Olhando agora para trás, sei que não é assim. O silêncio não é social, assim como não é uma expressão, um sentido, sentimento, substância ou a ausência de som, apenas porque é todas essas coisas e ainda outras que não me ocorrem.
O silêncio está na água e no movimento que só à água pertence, está no animal adormecido ou demasiado atento, está no homem que olha o vazio de si mesmo ou partilha rara implicidade com outro ser humano, está no som das coisas que não têm som, e está na morte... silêncio entranhado, estéril, frio, talvez o mais verdadeiro dos silêncios, o menos orgânico mas o mais natural. Talvez ele nunca nos tenha pertencido, apesar de o fazermos nosso. Talvez o silêncio esteja morto e não toque as coisas vivas por medo de deixar de ser aquilo que sempre foi para se tornar mortal como tudo o que vive.
Apenas uma coisa sei, o silêncio não existe sozinho, pois, como todas as coisas, necessita de uma razão, e essa razão é a palavra.


"Fala se tens palavras mais fortes do que o silêncio, ou então guarda silêncio"
Eurípedes - Fragmentos


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