19/01/10

Odeio chuva

Odeio chuva. Odeio o frio que acompanha a chuva e o nevoeiro esbranquiçado das nuvens sobre a terra. Odeio sentir as grossas gotas de chuva no pescoço descoberto e o cabelo encharcado sobre a testa. Odeio sentar-me em casa, no parapeito das janelas e ver a chuva cair violentamente, cada vez mais depressa, como se troçasse de mim. Odeio o som da chuva nas lajes e o som de um guarda-chuva a abrir.
Em minha casa não chove, ou pelo menos não chove como longe dela. Talvez por isso não goste de chuva. O mesmo livro que um dia me fez rir, num dia cinzento me parece deprimente, a mesma paisagem que me fazia sorrir, atira-me o espírito até às profundezas da minha auto-comiseração.
De manhã levantei-me, arrastando tudo o que em mim ainda dormia, recusando-se a despertar e vesti-me a custo, como quem ficou num lugar onde o corpo não alcança. Camisola sobre camisola, cachecol e casaco e todos os preparativos para um dia de chuva. As botas ainda frias da chuva de ontem arrepiaram-me cada osso desperto.
E por fim, o chapéu-de-chuva.
Abri a porta, abri o chapéu. E após um suspiro, saí.
E então lembrei-me. Lembrei-me de um dia ter saltado em poças de água fria com a felicidade da liberdade garantida, desfrutando sofregamente do cheiro a terra fresca, de me sentar nos parapeitos e desejar sair para a chuva, de voltar para casa com água a pingar-me das roupas grandes demais para o meu corpo escanzelado, com um sorriso nos lábios e nos olhos. Lembrei-me de casa.
Fechei o chapéu-de-chuva. O dia era meu.
Estava encharcada dos pés à cabeça e o frio era insuportável. Mas sorria.

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